segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Contos de amor pela metade

IV - O amor por nomear

Quando te riste assim de repente
será que pensaste no dia seguinte
noutros sorrisos por veres a manhã
no despertar de uma outra paixão
afinal o orgasmo que damos um ao outro
é feito também dos livros que lemos
e do café que saboreamos
todos os dias a nossa vida se acende
a tua alma tem sede e a minha tem fome
e os nossos corpos se apegam se chocam se fundem
numa ânsia do todo quando a vida é metade

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Contos de amor pela metade

III - Somos para ser entre os dois um nós

Já sabia de cor o sabor
das noites sobrepostas aos dias
e era para encontrá-la assim às escondidas
que ele se afogava todas as manhãs
num vácuo de espectro ensonado e triste
e todas as tardes com preceito
se imolava queimando no tédio
de não a ter nem sequer no pensamento

não lhe conhecia ainda o contorno
da alma que habitaria os seus dias
agarrava-se pois aquela dor
de vigiar a chegada da lua
e já sabia de cor o sabor
das noites sobrepostas aos dias
morria em cada espasmo dentro dela
só para prender o tempo que fugia

foi acendendo candelabros na penumbra
e onde era escuro a luz a desvelou
não só para um amor ainda ávido
e desfeito na pele feito para o gozo
mas para um amor que seria
em toda a ausência dela vestida ou nua
um desafio ao eterno e ao milagre
de sermos nós 
entre a noite e o dia
entre o sol e a lua

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Contos de amor pela metade

II - Tu és um ser para ti

Ele amava-a com romantismo persistente
mas ela nunca quiz casar
e ele acusava-a de uma entrega intensa e partilhada
sempre que se encontravam
uma dedicação autêntica
uma felicidade em estarem juntos
mas ela partia sempre dizendo
vou-me para o meu mistério
e deixo-te com o teu mistério

nunca casaram
mas mesmo assim ele ofereceu-lhe um anel de noivado
com a frase gravada
misteriosa história de amor com metade por contar

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Contos de amor pela metade

I - Tu és um ser para mim

Metade de ti
                      um sonho

Inteiro
             uma razão do meu viver

no princípio há uma sofreguidão do amor
não queremos as sobras
devorar o outro é também preencher as nossas faltas
diluir-se perder-se para se voltar a encontrar
e no render-se ao desconhecido faz-se a viagem
que se recorda no final

agora sinto que é nas suas sobras
que o amor encontra a sua verdadeira utilidade
e nos revela ora humildes ora inteiros
capazes de superar as várias armadilhas do ego

no princípio porém não percebemos isso