sábado, 29 de dezembro de 2012

O lugar do amor



Desde que nascemos
somos como amamos
e o amor é aquilo que alcançamos

morremos?
sim tantas vezes morremos
e o amor é aquilo que seremos






 porque somos corpo  
 parecemos presos a um lugar
 e pertencemos ás nossas gentes

 mas somos cá dentro
 livres como um sopro de ar
 que nos leva para lugares diferentes


 onde vamos?
 o amor vai fundo
 mas vai sem roteiro
 fica aqui mesmo
    e vai pelo mundo inteiro



sábado, 22 de dezembro de 2012

Yule




                      Nascer do sol em Stonehenge  Solstício de Inverno  21-12-2012 
                                                     
                                                                     

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Lembrete


Na tua casa sempre entra a luz 
- cultiva o desapego
quando por vezes ela é entaipada
pois lá dentro
todas as coisas se amam a si mesmas
e umas às outras














domingo, 9 de dezembro de 2012

Milagre


Por vezes
espera-se um milagre
e tu dizes só uma palavra
que nos suspende um olhar grave

porque vieste 
subitamente
sem medo e sem idade
encontraste um novo dia para mim

e até parece
que nas minhas mãos
não ficou mais nada

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Viemos dos sonhos


Viemos dos sonhos
olhos herdados na fome de infinito
mas sempre abrimos os olhos
e alcançamos a vida que é finita

quando olhamos nos dias vagos
reiventamos a vida
como um rumor na calmia dos lagos
ou um som de mar em sua eterna batida

viemos dos sonhos
olhos herdados na fome de infinito
e sempre que a chuva desce em afagos
somos como ela a chorar sentida




quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Fala-me do agora


Fala-me do agora
com palavras presentes
sem esperar o que seja do futuro
- ele existe em cada um de nós como projeto
mas cabe-nos viver em pleno a sua demora






















quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Revelação da dor


Foi na voz que a dor se ancorou
o corpo soluçou toda a lonjura
da dor naufragada no tempo
e foi assim em vagas muito lentas
que a dor na voz tardou


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Intersubjetividade


Entre nós existe este céu
e este azul é meu
e tu esse pássaro que volteia

e enquanto sucedemos nas palavras
destas nuances
desses voos

vou-me dando conta
que dentro de mim existe um fora
onde as tuas asas me estremecem

















domingo, 11 de novembro de 2012

Transe


entre os vivos tocaram os tambores
estremeceram na noite os bailarinos
no seu transe trespassaram os sonhos
e trouxeram as palavras transparentes
que os mortos deitavam ao lado do sono


segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Pandora


Do fogo revelado aos homens
da ira dos deuses
da inspirada lama moldada
a primeira mulher sublime e ágil
corpo e sopro
na desdita e no devir


















terça-feira, 23 de outubro de 2012

Afrodite


É húmido
lânguido o teu desejo
doce a paixão
é tormento o ensejo
chuva que traz os frutos
venturosa flor rosa
a murta-cheirosa
é o mar que se crispa exaltado
ou te acena num suave altar de espuma
para que vingue o sorriso na tua face
para que o teu canto guie os amantes
lhe mova as vontades num ímpeto alado
amoroso para lá de sensato
um voo de pássaros que a noite tece
à luz da lua num prado liso
onde a natureza copula os corações se amam
e a vida se perpetua



terça-feira, 16 de outubro de 2012

A flauta de Pã


Não queiras esconder-te no rio ainda
por entre os caniços e as flores a ti coladas
uma flauta virá para te chorar nos meus lábios
e todo o amor que não tive de ti amada


















sábado, 13 de outubro de 2012

Amanhecer


Aurora abrindo as portas do céu
e o sol secando a face da noite
deu-lhe sonhos filhos ventos
uma tela de sentimentos
dispersando na vigília ardente
as lágrimas frias de orvalho























terça-feira, 9 de outubro de 2012

Aurora boreal


E o sol explodiu em cores brilhantes
como uma aurora boreal

então chamei-o de estrela
e cantei para ela
os ventos polares
horizontes de cores e de sombras
buracos negros estelares



domingo, 30 de setembro de 2012

As visitas de Selene


Dorme encantado sem saber das horas
que contam a vida simples do amor
ainda está sozinho ao fim do dia
o pequeno pastor imortal

uma luz branca visita-o no seu vale estreito e breu
suave como quem vai acordar os pássaros
nas suas manhãs sem ninhos
como quem espera que os braços se alegrem em copas
e os beijos caiam como frutos maduros
num jardim de amantes meninos

























terça-feira, 25 de setembro de 2012

O Retorno do Sol



                   Celebrando o retorno do sol àquele momento inicial do sopro vital


domingo, 23 de setembro de 2012

Mabon




Quando baixa o sol
nos dias minguantes acertados com as noites
meditam as cores do ouro e do cobre
no chão das colheitas
preparam-se os lares para os tempos piores
lembram-se os mortos amados entre as gentes
estimam-se os velhos e os enfermos
 e celebram-se as sementes


quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Ártemis


Enquanto se banha nua
miram-na os homens condenados a morrer
nas suas peles de cervos dá para ver
como ela se vai libertando dos fardos humanos

mas a senhora das feras
também é parteira
nos homens faz nascer
o amor aos lobos aos bosques aos veados

ela é pura intuição
reverso do seu gémeo a razão
Zeus seu pai a presenteou com arco e flechas
e uma lira de prata
para que reinasse casta percorrendo as florestas

e quando as ninfas segredam seu amor a Orion
já numa outra praia Apolo seu irmão
vai desfazendo os enlaces desta humana paixão
enquanto as constelações se sucedem no céu

enquanto ela se banha nua
à luz da lua sob o seu véu
























segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Hermético


Criei o Todo na minha mente
anjo caído mergulhei na matéria
constatei a analogia entre os dois mundos
senti a vibração a impermanência
o milagre da transmutação
observei em tudo o seu duplo
a natureza polarizada
o oposto como um igual em grau diferente
aprendi a fluir
no ritmo eterno da existência
percebi a lei da causalidade
e em todos os planos
do físico aos mais subtis
encontrei-me com Afrodite
e dividi em macho e fémea meu ser andrógino























sábado, 15 de setembro de 2012

Mercúrio


Tuas falas 
conhecedoras do céu e do inferno
teus gestos
imbuídos de graça e de força
ensinaram aos homens
mil ofícios e habilidades

mensageiro dos deuses
condutor das almas
nos mistérios sete herméticos princípios
criaste para o universo























quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Perséfone


Como um despertar da consciência
descortinando a voltagem das emoções
assim é o teu mergulho nos infernos da alma
a tua prontidão para ir ao encontro do mundo sombrio
resgatando toda a vulnerabilidade que se esconde
na dor no silêncio na loucura

és aquela que brilha no escuro
íntima da morte rainha das trevas
esposa de Hades
raptada estuprada 
a tua inocência foi perdida
mas não perdes o jeito de confortar
tudo o que morre nesse reino

o teu mistério é o teu retorno cíclico 
a tua mãe Deméter que inconsolável
te espera com a promessa dos novos grãos
esse absoluto compromisso com a luz
com o conhecimento com o alimento da vida
























sábado, 1 de setembro de 2012

É leve o amor é firme o vento nascente


É difícil explicar
e talvez nunca vás entender
como agora sou feliz
sem ter medo de te perder
como rente a este chão onde juntos caminhamos
é leve o amor é firme o vento nascente
que te procura em mim
como se eu fosse levitar






















sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Casas onde se é feliz


Casas onde se é feliz
o amor vem puro e é entregue
para além da memória de todos os nomes
recebemo-lo assim ressuscitado
ávido a seduzir os sonhos
a intrometer-se de novo na vida

há um silêncio que se guarda
antes dos ecos habitados que hão-de vir
antes dos beijos furtados aos lábios
antes dos corpos tombados
nessa espera de renascer
(o amor)
nas casas onde se é feliz






















segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Sem oração


Sem oração
é aqui ou bem longe que se acendem as velas?
hoje choramos por outras guerras
e é sempre cedo ou tarde demais

flores breves trazem o cheiro da morte
e nem lhes somos gratos
adiamos a vida até que uma nova imprecisão
nos venha acordar a fé

e só era preciso agradecer à noite
pela morte vencida
pela promessa que vem da vida
pela certeza de mais um dia














quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Nada se perde tudo se transforma


Um mar abundante em peixes
e as filhas da lua num esquivo afeto
lançam sobre a terra
tal feitiço descuidado
que agora morrem os peixes
lágrimas de prata cobrem o mar
e as filhas da lua
já florescem nos lagos
já riscam o céu estrelado
lançando flechas como asas de anjo
num feitiço de amparo

terça-feira, 31 de julho de 2012

As crianças aparecidas: inocência


Antes de querer
antes de desejar
é inocente o pulsar do gesto
que faz o lado de dentro ficar de fora
antes de qualquer pre-conceito

antes de conhecer
antes de julgar
um pouco antes de tudo o resto
é inocente aquele momento
em que suspendemos tudo o que já somos
e como crianças
voltamos a nos entregar

e pode ser trágico
e pode ser belo
só a inocência nos dá o início do mistério



segunda-feira, 30 de julho de 2012

As crianças aparecidas: dúvida


Se eu olhar para além do meu lugar
e espreitar o teu céu a tua rua
se espiar a tua sorte os teus segredos
e desejar o teu abraço o teu aconchego

prometes
que não me vais prometer

o teu céu a tua rua
a tua sorte os teus segredos
mas apenas vais aconchegar
este meu desejo de te abraçar?

domingo, 29 de julho de 2012

As crianças aparecidas: pequeno buda


Sim alegro-me com tudo o que é simples e puro
mas ouvirás a minha gargalhada
quando decifrar o mais complexo dos mistérios

meus passos são livres e sei o caminho
que guiará a minha mente
para lá do apego dos meus sentidos

iluminado serei
mas não me julgues sem compaixão
tenho ainda desejos turbulentos e ilusões
pois sou ainda um pequeno buda

iluminado serei mas não te assustes
pois o que te der vem através de mim
não me pertence
e o que levarei de ti
será apenas a luz com que superaste o sofrimento

o teu olhar
o teu sorriso
a tua gargalhada no meio do caminho

quarta-feira, 25 de julho de 2012

As crianças aparecidas: olhos doces e uma mochila


Olhos doces e uma mochila
cheia de histórias por contar

... era uma vez uma menina
que procurava o seu lugar...

lágrimas são impossíveis de evitar
mas de dia ela só sabe contar
as mais belas histórias de encantar

é quando o sol se põe
e leva o dia
sente-se tão pequena
uma princesa encolhida
fadas e duendes perdem-se na escuridão
ela sabe que está sentindo o escuro
e que pode ver o gelo cercando
um lugar mais fundo
onde está o seu coração


















sexta-feira, 13 de julho de 2012

As crianças aparecidas: afogueados


Combinaram fazer uma fogueira
mas nenhum deles sabia fazer o fogo

alguém que nos ensine? gritaram

são miúdos afogueados
quando não sabem o que fazer
encostam as cabeças uns aos outros
a incendiarem os cabelos
antes de gritarem
de estarem assim esquecidos













quinta-feira, 12 de julho de 2012

As crianças aparecidas: flores apertadas


Vou fechar os olhos e pensar com muita força
que tu vais aparecer
e eu vou acordar
enquanto aqui todos os meninos dormem
apertados nos seus beliches

aqui também há um jardim
onde eu colhi estas flores para ti
mas elas murcharam num instante

















quinta-feira, 5 de julho de 2012

As crianças aparecidas: fugitiva


Tanto jeito de viver
no faz de conta de vestir despir embalar
o seu bebé de brincar
às vezes a menina tem ganas de jogar
a boneca ao chão
mas o que mais a assusta é acordar
com os pés dobrados de tanto correr
a sonhar que a vai salvar

- se eu fugir outra vez
  vais-me buscar?

  mãe?

















quarta-feira, 4 de julho de 2012

As crianças aparecidas: menino travesso


Menino moleque safado
poçinhas de lama trouxeste
vestiste o teu avesso - que peste
puseste a secar ralhetes - que fado

corre rapaz
entristece todo o meu sossego que se vai
e que amanhece nas tuas alegrias
do céu cai - ai ai
uma travessura que tu apanhas
todos os dias



















terça-feira, 26 de junho de 2012

Se eu fosse o mar


Se eu fosse o mar
e me espreguiçasse na areia
viriam até ti
todos os meus segredos de sereia?
























segunda-feira, 25 de junho de 2012

Sombra de ave


A minha silhueta
no paredão do cais
é uma sombra de ave
meditando antes do vôo











Esta terra magoa-me
onde está o meu ninho?

(Terra Sonâmbula, Mia Couto)

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Litha




pai dos grãos
estrela maior sol
brilha intensa e longamente
e guarda a sua filha
noite pequena


segunda-feira, 18 de junho de 2012

Por mais que tu me importes


Navego
mares de chão leve como o céu
dão-me asas nos barcos onde te espero
mas também naufrágios

a tua presença em mim
revolve águas antigas
talvez mesmo anteriores à memória
e eu estremeço incerta
e às vezes só em mim
encontro âncoras com que aporto

a solidão é isso
duvidar que me amas como sou
por mais que tu me importes


segunda-feira, 4 de junho de 2012

Se o mundo ficasse pronto - ser elemental


Ser de latência
incógnito
vem do lume de um sol noturno
da memória do sangue
vai-se manifestando
carnal
um ser das profundidades
as suas carnes
como as plantas rasgam a terra
e vão oxidando
mas o ar dá-lhe também vontades de voar
que se elevam para o céu como pássaros
e dessa ausência nascem os anjos
porém
o mundo ainda não fica pronto
porque deus caminha à beira da água
e o protótipo de ser
que é esse corpo
ligado a todo o sentimento
vai libertando lágrimas
onde cabem o mar
a vida e a morte
























sexta-feira, 25 de maio de 2012

Convocatória



Convoco-me:
corpo inteiro
e a minha alma é movimento
vento lançado livre para o mundo
assim é o meu pensamento
todos os dias opto por mim
sou ainda que mutável
a mesma habitante
duma casa que resiste
às vezes sou um lago
onde um narciso se deita
outras vezes a vastidão do mundo
é o meu jardim

terça-feira, 22 de maio de 2012

Tudo o que nasceu

Tudo o que nasceu é
envolto em luz
vontade de sondar o abismo
mistério que se vai desvelando
e se retrai se ocultando

tudo o que nasceu é
pequena fenda rasgando a escuridão
caminho de luz
na mestria de um xamã
onde da noite nasce o sol da manhã















quinta-feira, 10 de maio de 2012

O poeta revisitado

1

foi visitado num tempo propício
o tempo da sua breve história
entre a data do nascimento
e a data do óbito

2

foi visitado num tempo impróprio
o tempo em que os deuses fizeram história
e os homens a recontaram
em sucessivas datas e vidas

3

foi visitado num tempo eterno
o tempo em que os homens se revelaram
num diálogo original - a linguagem do ser
que fala com os deuses e solicita a natureza
























quinta-feira, 3 de maio de 2012

Raíz de liberdade

Desce desse lugar
onde te pensas ao longe
a vida é muito superior a ti
é um eterno devir
sei como é
queres alcançar o teu ideal a tua verdade
mas a morte espreita a cada instante
e qualquer futuro de retira
de cada instante em que te escolhes
- raíz de liberdade -
e te superas



















quinta-feira, 26 de abril de 2012

Esperando a primeira dança

assobiava sempre enquanto caminhava
acrescentava mais uma palavra
muito urgente naquela balada

pé-de-flor
pétala branca
árvore verde
folha em branco
escrevo verde
canto esperança

lá-no-amor
bebi o mar
mantenho a sede
vou pelo mundo
azul a voar
esperando a primeira dança
















domingo, 22 de abril de 2012

A vida que não é pensada

Não me lembro de nada
mas também nada esqueço
esta vida que não é pensada
também é minha
e nela permaneço

vivo apenas não penso
todos os sentidos imersos num mar
imenso
e o meu corpo nem se apercebe
que está a respirar

vivo como quem dorme
se eu pensar
vou acordar
mas vivo mais do que penso
é assim como num sono
sei que estive a sonhar
mas com o quê
só se me recordar
























sábado, 21 de abril de 2012

Vale eu ter disposição

Vale eu ter disposição que me cubra
como se fora passear o corpo
num rio de águas doces
e me desabituasse do veneno
das almas

vale eu ter disposição que me curva
o coração num olhar mais frio
para os rostos incendiados
fazendo-me igual aos deuses
sem desejo
apenas justa
























quarta-feira, 11 de abril de 2012

Chão esquecido (canção de embalar)

Nesse chão esquecido eu traço
uma casa com terraço
donde vejo o céu inteiro
e nos teus braços sou primeiro

vejo o sol que está curado
vejo três nuvens sangrando
e só no teu colo demorado
vou com a chuva sossegando