Há ...

Há sementes pousadas 
nas concavidades das horas
à espera de florirem os prados

Há dias mapeados nos nossos corpos
com as coisas do quotidiano
à espera das grandes escolhas

Casa em construção

Guardo para um 
futuro próximo
um universo de sentimentos
e o projecto de uma casa
desconstruída em cada viagem
sonhada em cada paragem

calada 
a noite acorda vozes
que ignorei durante o dia
e eu não sei se o que guardo
é aquilo que sonhei
ou se os meus sonhos
foram guardando
tudo aquilo que sentia

Sob a chuva

Sob a chuva
tombam pássaros
alados
suas asas molhadas
são os códigos dos cílios
no esquecimento 
dos sonhos

na enxurrada
folhas e lama
vêm misturadas
e eu não separo
os instintos mais belos
dos disfarçados
na confissão dos sonhos

Retrato

É difícil desvendá-lo
cativá-lo
entre as sombras e a luz
decifrá-lo
na sua líquida essência
como só os olhos calados 
dos gatos
o fazem

Para sempre um outro

Para sempre separado
para sempre um outro
no seu mistério insidioso
para além do nosso laço
da cúmplice caminhada
dialógica relacional
para sempre longe 
do meu domínio

assim és
um outro incogniscível
hospedado na minha casa
eu parteira das tuas descobertas

Máscara

Permite-me
a queda do fascínio
o indizível errar
que rompe qualquer 
deslumbramento
sou fiel em amar-te
assim como te mostras
e como te escondes
na repetição do corpo
- seu avesso

Beltane